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Revista M&T - Ed.215 - Agosto 2017
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Dragagem

Ambientalmente correta

Com o uso de equipamentos apropriados, a dragagem ambiental lança mão de estudos e monitoramento para reduzir os impactos ambientais da operação convencional
Por Santelmo Camilo

O acesso entre a praia do Góes e a praia de Santa Cruz dos Navegantes, no município de Guarujá (SP), na Baixada Santista, agora só pode ser feito por mar. No local, havia uma trilha histórica com mais de 300 anos de existência ligando essas duas comunidades, que desmoronou devido ao aumento da força hidrodinâmica das ondas na entrada do canal do Porto de Santos. Embora muitos atribuam essa destruição ao mero aumento do nível do mar, uma pesquisa aponta que na verdade ela foi provocada pelo processo de dragagem para aprofundamento do canal portuário.

Além da destruição da trilha, outros impactos socioambientais estão sendo relatados nas comunidades vizinhas, como assoreamento em praias de Santos e Guarujá, inutilização de píer de atracação de embarcações e aumento de erosão, além de avanço do mar com maior intensidade durante as ressacas, invadindo ruas e prédios que margeiam o canal do porto no bairro da Ponta da Praia.

A pesquisa foi realizada pelo especialista em logística portuária, Rafael Alves Pedrosa. De acordo com ele, a implantação das obras de dragagem no canal do Porto de Santos é essencial e traz um viés econômico relevante, mas ainda não se consegue equalizar questões estruturais e ambientais, alterando espaços utilizados diariamente pela comunidade costeira. Isso torna necessária a adoção de medidas mitigatórias pelos órgãos públicos.

Há dois anos, Pedrosa participou de uma audiência pública realizada na 3a Vara da Polícia Federal e, hoje, relata a diferença nítida existente entre os interesses do Ministério Público (MP) e da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp). “O MP comprovou com imagens e dados resultantes da batimetria (verificação de profundidade) do estuário os impactos ocorridos nas praias, principalmente com a erosão constatada na Ponta da Praia, em Santos, e o assoreamento da Praia do Góes, no Guarujá, e na região do emissário submarino de Santos”, diz ele. “Por outro lado, a Codesp alegou ter investido mais de 40 milhões de reais em estudos sobre os possíveis impactos das obras, negando desta forma que a dragagem seja a responsável pelos ocorridos nas praias e, acima de tudo, ressaltou a importância da continuidade do processo de dragagem para o desenvolvimento


O acesso entre a praia do Góes e a praia de Santa Cruz dos Navegantes, no município de Guarujá (SP), na Baixada Santista, agora só pode ser feito por mar. No local, havia uma trilha histórica com mais de 300 anos de existência ligando essas duas comunidades, que desmoronou devido ao aumento da força hidrodinâmica das ondas na entrada do canal do Porto de Santos. Embora muitos atribuam essa destruição ao mero aumento do nível do mar, uma pesquisa aponta que na verdade ela foi provocada pelo processo de dragagem para aprofundamento do canal portuário.

Além da destruição da trilha, outros impactos socioambientais estão sendo relatados nas comunidades vizinhas, como assoreamento em praias de Santos e Guarujá, inutilização de píer de atracação de embarcações e aumento de erosão, além de avanço do mar com maior intensidade durante as ressacas, invadindo ruas e prédios que margeiam o canal do porto no bairro da Ponta da Praia.

A pesquisa foi realizada pelo especialista em logística portuária, Rafael Alves Pedrosa. De acordo com ele, a implantação das obras de dragagem no canal do Porto de Santos é essencial e traz um viés econômico relevante, mas ainda não se consegue equalizar questões estruturais e ambientais, alterando espaços utilizados diariamente pela comunidade costeira. Isso torna necessária a adoção de medidas mitigatórias pelos órgãos públicos.

Há dois anos, Pedrosa participou de uma audiência pública realizada na 3a Vara da Polícia Federal e, hoje, relata a diferença nítida existente entre os interesses do Ministério Público (MP) e da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp). “O MP comprovou com imagens e dados resultantes da batimetria (verificação de profundidade) do estuário os impactos ocorridos nas praias, principalmente com a erosão constatada na Ponta da Praia, em Santos, e o assoreamento da Praia do Góes, no Guarujá, e na região do emissário submarino de Santos”, diz ele. “Por outro lado, a Codesp alegou ter investido mais de 40 milhões de reais em estudos sobre os possíveis impactos das obras, negando desta forma que a dragagem seja a responsável pelos ocorridos nas praias e, acima de tudo, ressaltou a importância da continuidade do processo de dragagem para o desenvolvimento econômico local e nacional. A companhia destacou, inclusive, que o fim da dragagem não colocará um fim na erosão”, narra Pedrosa.

A audiência terminou com a Codesp sendo pressionada pelo MP para realizar novos estudos sobre os impactos. A Universidade de São Paulo (USP) será envolvida para elaborar um estudo sobre a redução da largura do canal no trecho mais externo do estuário, ao passo que a Autoridade Portuária irá disponibilizar relatórios a cada dois meses sobre a batimetria, a velocidade das correntes e a energia das ondas locais.

EXIGÊNCIAS

Caso seja necessário, há um processo com tecnologia avançada utilizado em várias partes do mundo e que começa a ganhar espaço também no Brasil. A dragagem ambiental, como é chamada, consegue reduzir o potencial impacto da obra, minimizando danos ambientais ao conciliar equipamentos como dragas de sucção e recalque, balsas e escavadeiras dragline a estudos de impacto e monitoramento de dispersão de sedimentos contaminados.

As bombas utilizadas possuem sensores de filtros que retiram o sedimento com alto teor de sólidos e pouca quantidade de água. “Durante o processo, removem em camadas superficiais os sedimentos sem que haja ressuspensão de compostos contaminantes, diminuindo consideravelmente o impacto gerado no processo de dragagem”, explica Pedrosa. “Por não revolverem o fundo do canal, os equipamentos evitam a liberação de metais pesados, que atingem o ecossistema marinho.”

Na dragagem ambiental, o aprofundamento da quilha do canal é precedido de um estudo que define o limite de profundidade, para não causar derrocamento das laterais. Segundo Leonardo Cavalcanti, diretor de comunicação da Luschi Soluções em Engenharia, Saneamento e Meio Ambiente, as bombas de polpa trabalham com até 70% de sólidos, retirando maior fração de material contaminado com menos água. As dragas de sucção e recalque podem ser acionadas por controle remoto e alcançam profundidade de dragagem de até 28 m abaixo da linha d’água. “A eficiência dos equipamentos possibilita uma dragagem de baixo impacto, possibilitando o desenvolvimento portuário sem danos ao meio ambiente”, observa.

As soluções podem atingir uma distância de descarga máxima de até 1 km a partir do ponto de dragagem, dependendo da potência da bomba. “Os flutuantes modulares possuem dimensões pequenas, que possibilitam transporte em caminhões, sendo também adequados para trabalhar em operações de dragagem em águas rasas”, explica Cavalcanti.

Essas dragas são acopladas em bombas submersíveis elétricas de 4 a 12 polegadas, com vazão de bombeamento de dragagem de 80 a 900 m3/h, além de poderem se integrar a sistemas de dragagem com equipamentos já existentes. “A alta capacidade de bombeamento de sólidos possibilita uma produção de dragagem de cerca de 1.000 m3/h”, estima Cavalcanti. Além dos equipamentos, o especialista considera que a melhor maneira de realizar uma obra de dragagem ambiental é contar com acompanhamento técnico eficiente e equipe capacitada para oferecer soluções, desenvolver estudos e metodologias para lidar com imprevistos, de maneira a evitar qualquer possibilidade de impacto ambiental. “O equipamento ajuda a controlar a contaminação, mas a expertise para lidar com as adversidades do ambiente é fundamental”, reitera.

DESAFIO

Um caso exemplar de dragagem ambiental foi realizado na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro (RJ), local contaminado e com assoreamento que prejudica a passagem de embarcações. Lá, a Luschi dragou mais de 29 mil m3 de sedimento contaminado e removeu lixo num trecho de atracação de navios, utilizando dragas de sucção e recalque.

Os sedimentos contaminados foram encapsulados por tubos geotêxteis e acomodados em grandes leitos para contenção, desaguamento, desidratação, consolidação e transporte para aterro sanitário. O material não contaminado foi descartado em bota-foras marítimos classificados pela autoridade portuária.

Segundo Cavalcanti, havia trechos com sedimento contaminado recoberto sob outra camada superior, sem contaminação. “Isso ocorreu devido a vazamentos de petróleo, tintas de pintura e manutenção de estaleiros que iam parar na baía em épocas sem controle ambiental”, explica. “O tempo foi passando e houve sedimentação natural, enterrando uma camada de contaminação infiltrada, tornando mais difícil precisar o que era ou não tóxico.”

Foi necessário classificar o material antes de iniciar a dragagem, destinando o sedimento contaminado para aterro sanitário e areia não contaminada para bota-fora marítimo. Esses bota-foras são selecionados de forma criteriosa pela marinha, para o material descartado não ser movimentado pela correnteza e assorear outros locais.

A dragagem ambiental, contudo, exige acompanhamento contínuo e às vezes requer adaptações durante o processo. A Baía de Guanabara tem muito entulho carreado pela descarga de esgotos, canais e lixo jogado pela população, o que em alguns casos dificulta a sucção da bomba, provocando até seu entupimento. “A alternativa é intercalar escavadeira dragline ou clamshell para retirar lentamente o sedimento e evitar a suspensão”, explica Cavalcanti. “Enquanto esses equipamentos são utilizados, fazemos o monitoramento no entorno, coletando amostras de água em pontos específicos para analisar se a contaminação se espalha. Os resultados não devem ter aumento de elementos contaminantes.”

No caso do Porto de Santos, compara o diretor, a obra de dragagem ambiental pode se tornar mais onerosa devido à dificuldade de destinação de material contaminado. “Não há aterro sanitário nas proximidades”, ele adverte. “Assim, o material dragado deverá ser encapsulado nos veículos e percorrer grandes distâncias.”

DESASSOREAMENTO

As dragas de sucção e recalque com acionamento hidráulico também são aplicadas em processos de dragagem ambiental em tanques, lagoas e estação de tratamento industrial, nos quais a água residual pode ser purificada e retornar à estação, ou ser devolvida ao corpo hídrico livre de impurezas.

O engenheiro ambiental da Soludraga, Renan Gobbo, reconhece que a dragagem já possui soluções técnicas a serem mais bem exploradas. O lodo gerado nos processos industriais passa por sistemas de tratamento internos para perder o teor químico, conforme determinam as normas legais. Depois, segue para a lagoa de estabilização e decantação de sólidos, como uma das últimas etapas do tratamento.

Isso é necessário quando os métodos de descontaminação dos resíduos ficam muito onerosos, exigindo uso elevado de produtos químicos para melhorar o processo da lagoa. “No final, são feitas todas as análises normativas e a água é devolvida ao meio ambiente, dentro dos parâmetros legais da resolução Conama 430”, garante Gobbo.

Essas lagoas possuem dimensões variadas, chegando a medir 170 x 110 m ou 500 x 200 m. São muito utilizadas em indústrias como mineração ou estações de tratamento de água, com lodos de sólidos totais que podem variar de 2 a 12%, dependendo do processo. “Quando estão assoreadas, elas retardam o tempo de decantação”, salienta Gobbo. “Por isso, a dragagem é necessária para normalizar o processo.”

A Soludraga utiliza bombas dragas com acionamento a diesel, sobre balsas que variam de 10 x 6 m a 12 x 6 m. Nas bombas-barcas, o lodo passa através de tubulação pelo sistema de sucção e recalque, diferentemente das submersas, que ficam diretamente sobre o lodo para realizar o bombeamento. “São adaptadas com a parte rotativa e acoplamentos, com capacidade de seis e oito polegadas e produção até 450 m3/h”, diz o engenheiro. “Se o lodo tiver consistência sólida, deve ser dragado com escavadeira hidráulica, embora esse equipamento dificilmente seja utilizado em dragagem ambiental industrial”, conta. “Isso porque as lagoas assoreadas geralmente possuem camada de impermeabilização com geomembrana ao fundo, para proteger o solo do contato com o material decantado, já que as unhas das caçambas podem danificar essa proteção”, acresce.

Após ser dragado, o sedimento passa por um processo de desidratação, secagem e decantação centrífuga, perdendo ao menos 75% de umidade para ser transportado. “Durante a operação de sucção e recalque, o lodo é lançado na esteira transportadora e segue para o caminhão”, relata Gobbo. “No outro lado, a água sai clarificada e sem presença de sólidos. O processo de secagem funciona como uma centrífuga, na qual é feita a adição de polímeros em flocos ou líquidos específicos para lodo.”

SEDIMENTOS

Além das dragas de sucção e recalque, os equipamentos frequentemente utilizados em obras de dragagem são as escavadeiras draglines, long reach e convencionais. Cavalcanti, da Luschi, revela que a maior parte da frota de máquinas de dragagem no Brasil é composta por equipamentos antigos adaptados.

Isso porque o preço de um equipamento novo é muito elevado e, por outro lado, as contratantes relutam em investir em processos de baixo impacto. Contudo, em dragagem convencional para desassoreamento de rios como o Tietê, por exemplo, que não requer procedimentos tão elaborados como a portuária, as escavadeiras dragline são os equipamentos mais eficientes devido ao maior alcance à frente. “Elas retiram volume maior de material em menos tempo”, explica Cavalcanti.

As escavadeiras hidráulicas são mais limitadas em alcance do braço. “Os modelos long reach escavam em ângulo côncavo, à frente e abaixo da margem onde trabalham”, descreve. “Mas, normalmente, se utilizam três escavadeiras nessa operação: uma para escavar e dar tombo no material e duas para fazer o mesmo procedimento em linha, até que o sedimento escavado seja descarregado na margem.”

Após passar por um processo de deságue e secagem, o material dragado é embarcado em caminhões por pás carregadeiras ou escavadeiras que, assim como os demais equipamentos, devem passar por manutenções criteriosas para evitar contaminação no sistema hidráulico.

COMO É FEITA A DRAGAGEM

A dragagem é uma obra de desassoreamento, alargamento e desobstrução de material do fundo de rios, lagoas, baías e canais de acesso a portos. Segundo o especialista em logística portuária Rafael Pedrosa, o objetivo é realizar a manutenção ou aumentar a profundidade. “A dragagem de manutenção mantém determinada profundidade, enquanto a dragagem de aprofundamento aumenta a profundidade e largura, seja por equipamentos que fazem a sucção do sedimento ou dragas que aumentam a quilha do canal”, explica.

De acordo com ele, o valor contratado para as obras de dragagem em Santos foi de aproximadamente 237 milhões de reais, para se extrair milhões de metros cúbicos de sedimento e deixar o canal com aprofundamento máximo de aproximadamente 15 m. Um dos problemas da dragagem convencional em áreas portuárias é que, ao se fazer a sucção ou escavar o fundo do canal, o sedimento é revolvido, ocorrendo suspensão de elementos contaminantes tóxicos depositados no solo. “O sedimento retirado é descartado em bota-foras marítimos a cerca de 15 milhas náuticas da costa, mas pescadores já encontraram sedimentos contaminados de dragagem em praias de diferentes pontos da Baixada”, diz Pedrosa.

INTERVENÇÕES GERAM PROBLEMAS NAS CIDADES

Recente estudo feito pelo governo federal prevê que serão necessários quase 30 bilhões de reais para adaptar a estrutura dos portos brasileiros frente às alterações climáticas, sendo que no Porto de Santos deverão ser investidos cerca de 5,6 bilhões de reais. “Mas se forem feitas dragagens ambientais, os custos serão menores para um trabalho menos agressivo e sustentável”, observa o professor Rafael Pedrosa.

No caso de Santos, o mar avança com mais intensidade durante as ressacas, invadindo ruas e prédios que margeiam o canal do porto no bairro da Ponta da Praia. Rafael questiona que essas enchentes sejam atribuídas exclusivamente à elevação do nível do mar, que se tiver de subir, não subirá em pontos isolados. “Se fosse assim, haveria redução da faixa de areia em toda a extensão da orla da praia, mas isso só está acontecendo nas regiões impactadas pela dragagem”, explica.

A falta de estudos para dragagem resultou nesse aumento da força hidrodinâmica das ondas e requer providências, principalmente porque as muretas que margeiam a região da Ponta da Praia podem estar com os dias contados. “Na República Tcheca, por exemplo, os gestores encontraram uma alternativa para um problema similar, desenvolvendo calçadões com degraus e galerias, por onde a água entra e retorna, fazendo um fluxo contrário que amortece a força das ondas”, explica Pedrosa. “Esse é o papel dos manguezais, que vem sendo destruídos pela atividade humana e deixa as cidades litorâneas cada vez mais expostas.”

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